Reconhecimento de união estável com cuidadora de idosos
Temos vivido em nosso país uma situação de aumento da expectativa de vida da população, o que tem gerado, como consequência, o crescimento do número de pessoas idosas. Tal fato tem proporcionado uma ampliação na demanda dos serviços de cuidador para atendimento das necessidades dessa parcela da população. A profissionalização é uma tendência cada vez mais observada, sobretudo nos grandes centros, onde o ritmo de vida muitas vezes impede a família de assumir sem apoio externo os cuidados necessários.
Tramitam no legislativo propostas de regulamentação da profissão, com o objetivo de estabelecer com clareza as atribuições, qualificações necessárias e demais aspectos da profissão. A preocupação é extremamente relevante, sobretudo porque muitas vezes esse serviço é prestado de maneira informal e inevitavelmente gera vínculos emocionais com a família e com o próprio idoso, o que deve ser objeto de cautela por parte de quem contrata o serviço. A falta de formalização do vínculo e a ausência de regulamentação específica da profissão acabam por entregar ao judiciário a tarefa de resolver conflitos que surgem nessa relação. Nesse contexto, cabe chamar atenção para uma situação que vem acontecendo com frequência cada vez maior: o desenvolvimento de relacionamentos afetivos entre o idoso e o cuidador durante a vigência da relação de trabalho.
Sem entrar no mérito dos aspectos éticos e morais desse tipo de situação, fato é que o profissional cuidador passa longos períodos na companhia do idoso, desenvolvendo laços de confiança e afeto que em determinadas situações se transforma em um relacionamento amoroso, muitas vezes sem o conhecimento da família. Quando a situação perdura, dependendo das particularidades do caso, existe a possibilidade de a relação de trabalho se confundir com uma união estável, e isso tem levado pessoas, nem sempre de boa-fé, a buscar em Juízo o reconhecimento da união estável após o falecimento do idoso. Nesse sentido, trazemos recente julgado do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. PEDIDO AJUIZADO APÓS A MORTE DO SUPOSTO COMPANHEIRO. CONVÍVIO INCONTROVERSO. COMPROVAÇÃO DE CONVIVÊNCIA PÚBLICA, CONTÍNUA E DURADOURA E COM INTUITO DE CONSTITUIR FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL CONFIGURADA. EXEGESE DO ARTIGO 1.723 DO CÓDIGO CIVIL. SENTENÇA MANTIDA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. EXEGESE DO ART. 85, § 11, DO CPC. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I – Para o reconhecimento da união estável é necessária a comprovação cabal da vida em comum, contínua e duradoura com intenção de constituir entidade familiar. Ausentes esses requisitos, impossível o reconhecimento da relação pretendida, conforme preceitua o artigo 1.723 do Código Civil. Além da parte autora ter feito prova suficiente do fato constitutivo de seu direito, os Réus não trouxeram aos autos elementos capazes de derruir a pretensão articulada na exordial, que provou satisfatoriamente a união estável com o falecido, muito além, portanto, da prestação de serviços a título de “cuidadora”. II – Levando-se em conta o trabalho desenvolvido pelo procurador da Apelada em sede recursal, com fulcro no artigo 85, § 11, do CPC/15, devem ser majorados os honorários advocatícios fixados em seu favor. (AC: 03003659720168240091 , Relator: Joel Figueira Júnior, Data de Julgamento: 05/04/2018, Quarta Câmara de Direito Civil,TJ-SC)